SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) – A empresária Andrea Cola, neta do fundador do Grupo Itapemirim Camilo Cola, disse, em entrevista à coluna Capital, do jornal O Globo, que ela e o avô alertaram ministros e parlamentares em 2020 sobre os riscos de se autorizar a Ita (Itapemirim Transportes Aéreos), que parou de operar repentinamente em dezembro do ano passado, causando caos nos aeroportos e deixando milhares de passageiros sem atendimento.
“Em 2020, fui com o meu avô a Brasília e alertamos o ministro Tarcísio [Freitas, titular da Infraestrutura] sobre o que estava acontecendo na recuperação judicial. Alertamos que assim como Sidnei [Piva, dono da Itapemirim] não honrou compromissos firmados conosco, ele não iria honrar com o país. Não foi falta de aviso. Deu no que deu”, relatou Andrea. Camilo faleceu em novembro de 2020, aos 97 anos.
Em dezembro, Tarcísio disse que a Itapemirim tinha todas as condições para operar. Segundo o ministro, a aérea tinha cumprido todos os requisitos necessários para obter a certificação da agência reguladora, a Anac (Agência Nacional da Aviação Civil).
A reportagem procurou o Ministério da Infraestrutura hoje e aguarda retorno. Andrea foi executiva da Itapemirim por 16 anos e já estava fora da empresa quando o avô e o pai entraram com pedido de recuperação judicial e venderam o negócio para Piva por R$ 1, em 2016.
Agora, ela trava uma disputa com ele para tentar recuperar parte do patrimônio da família.
A Associação de Credores Trabalhistas e Ex-Funcionários do Grupo Itapemirim criticou os gastos com a empresa aérea. Esses valores, segundo a associação, poderiam estar sendo gastos no pagamento das dívidas da empresa com os credores do grupo.
De acordo com relatório da administradora que acompanha a recuperação judicial do grupo, até novembro de 2021 foram gastos cerca de R$ 32,3 milhões do dinheiro da empresa com seu braço aéreo.
Os credores tentam autorização judicial para realizar uma assembleia e afastar Sidnei da gestão. Como credora da empresa, Andrea diz que tem atuado no processo de recuperação judicial. “Venho tentando denunciar as falcatruas, mas me acusam de tumultuar o processo, de fazer litigância de má-fé. Já tomei várias multas da Justiça.”
Segundo ela, no acordo feito com Sidnei havia um combinado de que imóveis pessoais que não estavam relacionados com a operação seriam transferidos de volta para a família.
“Mas em 19 de dezembro de 2016 eles conseguiram na Justiça se apossar da empresa antes mesmo de a gente finalizar os contratos. Em março do ano seguinte, Sidnei entrou com cláusula arbitral pedindo a validação do contrato e desde então a gente vem brigando.” “O apartamento da Avenida Atlântica foi ocupado. O Sidnei invadiu, trocou a fechadura. Parece que passou o Ano Novo lá. Ele não se deu ao trabalho de devolver nem as roupas e os sapatos do meu avô. Meu avô ia muito lá. Era a segunda casa dele. Nem sei se esse imóvel um dia volta pra gente”, acrescentou Andrea.
Questionada se acredita que o negócio rodoviário ainda pode sobreviver, ela diz esperar que o resto do patrimônio seja revertido para a empresa para pagamento dos credores. “Mas é preciso que a gente tenha uma nova assembleia para nomear um interventor. Acredito que a empresa ainda pode se recuperar. A imagem está manchada, mas é uma marca forte. Acredito no negócio. O Brasil viaja de ônibus.”
No início de fevereiro, o TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) determinou a busca e apreensão de 61 ônibus da viação Itapemirim. A decisão foi tomada pela juíza Fernanda de Carvalho Queiroz a pedido do Banco Moneo, instituição financeira ligada à empresa Marcopolo, que produz carrocerias de ônibus.
Segundo a magistrada, o banco comprovou que a Itaperimim é devedora da instituição. Andrea diz ainda que Sidnei tem que ser afastado. “Se ele permanecer, será uma questão de tempo (para a falência). Com um gestor de boa-fé, as empresas ainda podem ser salvas.”
O UOL procurou a assessoria da Itapemirim sobre as declarações de Andrea e aguarda retorno.
Relembre o caso
Conforme mostrou reportagem do UOL publicada ontem, no dia 17 de fevereiro acabou o prazo dado pela Itapemirim Transportes Aéreos para voltar a voar.
O prazo foi informado ao Procon-SP pouco após a interrupção da operação da empresa, em 17 de dezembro de 2021, e acabou não sendo cumprido.
Nesses dois meses, a empresa acumulou processos trabalhistas, pedidos de reembolso não atendidos, proibição de voar e vender passagens pela Anac, entre outros problemas.
Apenas no Tribunal de Justiça de São Paulo são mais de 600 processos movidos contra o braço aéreo do Grupo Itapemirim.
A maior parte é relativa ao cancelamento de voos, danos morais e reembolso das passagens que não foram honradas. Sobre esta questão, a empresa disse em nota: “Em relação ao reembolso, a empresa mantém entendimentos com seus clientes priorizando sempre o acordo amigável. Quanto aos processos impetrados, a empresa respeita o direito dos cidadãos de recorrer à Justiça, mas tem fechados acordos extrajudiciais. Da mesma forma trata outras questões levadas à Justiça, buscando sempre o acordo para cumprir seus compromissos.”