Festival de Berlim aposta em menos Hollywood e mais autores

Berlim (Alemanha) – Em fevereiro de 2020, quando o Festival de Berlim vivia sua última edição presencial, dois assuntos dominavam os intervalos entre uma sessão e outra. Metade dos papos era sobre os filmes em competição, mas o resto das conversas era sobre um tal de vírus SARS-CoV-2 -que, após aterrorizar a população da China, começava a fazer estragos logo ao lado, na Itália.  Duas semanas depois, a Organização Mundial da Saúde anunciava que o mundo estava diante de uma pandemia de Covid-19, e o que aconteceu em seguida já é bem conhecido. 

Este ano, a variante ômicron forçou a Berlinale a comprimir a festa. Em vez dos 11 dias habituais, neste ano só serão seis. As sessões terão metade da capacidade de público, e todos precisarão usar máscara, apresentar certificado de vacinação completa e fazer um teste rápido antes – o procedimento deve se repetir a cada dia. A curadoria, porém, manteve 18 longas em competição, obrigando jurados e jornalistas a se desdobrarem para ver as obras num espaço de tempo bem mais reduzido. 

O evento começou na quinta-feira (10), sem grandes festas – que, aliás, neste ano estão vetadas -, mas um tapete vermelho enxuto ainda é permitido. E a primeira equipe a passar por ele foi a do longa francês “Peter von Kant”, dirigido por François Ozon – o filme se inspira na obra de Rainer Werner Fassbinder e marca a primeira colaboração do cineasta com Isabelle Adjani. 

Estrelas hollywoodianas praticamente não darão as caras neste ano – os filmes escolhidos para a edição foram, em geral, de diretores de marca mais autoral. 

O Brasil não tem longas na competição principal, mas seis produções nacionais estão no evento. Na mostra Panorama, a segunda mais importante, o país é representado pelo longa “Fogaréu”, de Flávia Neves, sobre o reacionarismo de uma cidade do interior, enquanto na seção mais experimental Forum, os longas nacionais são “Mato Seco em Chamas”, que o goiano Adirley Queirós dirige ao lado da portuguesa Joana Pimenta, e “Três Tigres Tristes”, de Gustavo Vinagre, seu terceiro longa em menos de um ano. 

“Manhã de Domingo”, de Bruno Ribeiro, disputa o prêmio de melhor curta da Berlinale, e na mostra Forum Expanded, o Brasil traz, no mesmo formato, “O Dente do Dragão”, de Rafael Castanheira Parrode, e “Se Hace Camino al Andar”, de Paula Gaitán. 

Nada que se compare a outros tempos, como em 2020, quando 19 filmes com DNA brasileiro participaram do festival, contando as coproduções. É preciso, no entanto, entender o contexto. Além de a Berlinale estar menor, o audiovisual do Brasil sofre com o efeito arrasador da pandemia sobre a classe artística, e só agora começam a dar as caras os resultados do desmantelamento das políticas públicas para a cultura da era Bolsonaro e do caos interno em que a Ancine, a Agência Nacional do Cinema, se meteu desde a posse do atual presidente. 

Segundo Eduardo Valente, delegado brasileiro da Berlinale, o fato de ainda existir uma produção nacional relativamente volumosa – mais de 80 longas do Brasil se inscreveram no festival neste ano – se deve sobretudo a uma certa retenção do lançamento de filmes que foram produzidos ainda antes do governo Bolsonaro. 

O filme “Peter von Kant”, dirigido pelo francês François Ozon, abriu o Festival de Berlim |  Foto: John Mac Dougall/ AFP 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *