Foz do Iguaçu – As noites de Puerto Iguazú podem não ser as mais glamorosas do mundo. Mas são suficientemente divertidas e instigantes para justificar uma espera de mais de uma hora na fila de carros que chegam do Brasil, formada antes do controle alfandegário rigoroso. A argumentação dos argentinos para encarar a lenta travessia na fronteira se mostra bastante convincente. Sim, vale a pena.
E não só pela experiência de uma segunda visão das Cataratas, cenário natural dos mais conhecidos da América do Sul. A sensação de estar sobre e muito próximo à furiosa Garganta do Diabo, explicam eles, descarta qualquer risco de redundância e rende até chiste publicitário.
No caminho entre a cidade e a entrada do parque, uma cervejaria faz uma brincadeira espirituosa no outdoor, com a foto de um copo da bebida prestes a ser saboreado: a um passo da garganta.
Também vale a pena não só pela hospitalidade misionera, pelo comércio de vinhos, pelo fernet com gelo e coca-cola, pelas cervejas inéditas com a água leve dos Andes ou pelos filés tão macios quanto saborosos.
Na retomada do turismo na pós-pandemia, nos passeios noturnos em busca da melhor empanada ou da mais farta “picada”, aquela porção de queijos, embutidos e azeitonas que só acaba depois da conversa, uma imagem nova e poderosa se revela no horizonte da charmosa Iguazú.
Da Victoria Aguirre, a avenida principal que distribui o tráfego do footing noturno, o colorido das luzes em forma circular avisa que a região da Tríplice Fronteira, mais especificamente o encontro em forma de T dos rios Paraná e Iguaçu, já não é mais o mesmo.
A Yup Star, uma das maiores rodas gigantes da América Latina, inaugurada em dezembro do ano passado, é grande demais para ser ignorada. Mesmo que esteja instalada no país vizinho, do outro lado do Rio Iguaçu. Seus 48 metros de diâmetro cintilam com quatro quilômetros de led fixados nas 400 toneladas de aço.
A Yup Star se tornou símbolo de uma nova fase no Porto Meira, região ao sul do município de Foz que abriga o Marco das Três Fronteiras, onde três obeliscos com as cores das bandeiras nacionais podem ser vistos de um mesmo ponto, seja em que lado da fronteira você esteja.
Em 2023, há promessa de mais brilho nesse horizonte em metamorfose. Praticamente pronta, a chamada Ponte da Integração deve ser ativada em 2023 (leia mais nesta página), justamente entre a roda-gigante e o complexo do mirante.
A previsão é que o conjunto de cabos que sustentam a via também seja ornamentado com luzes coloridas, deixando a paisagem ainda mais atraente no Porto Meira, com saldo positivo para os três lados da fronteira.
PASSEIOS NÁUTICOS E TELEFÉRICO
Felipe Gonzalez, presidente do Visit Iguassu, bureau que congrega a indústria do turismo na fronteira, prevê um ciclo de investimentos em hotelaria, gastronomia e outros serviços a partir de 2023.
Em alguns anos, outros dois equipamentos devem reforçar o pólo, o terminal de passageiros para passeios náuticos e a recuperação do Fórum das Américas, um anfiteatro imponente desenhado pelo ex-governador Jaime Lerner, construído na barranca do rio em 1997 e que se tornou praticamente uma ruína depois de quase duas décadas de abandono.
Fórum das Américas, anfiteatro imponente desenhado pelo ex-governador Jaime Lerner, será revitalizado | Foto: iStock
“Está prevista a construção de um teleférico sobre a mata entre a parte já revitalizada do marco até o anfiteatro, local próprio para eventos especiais”, conta Gonzalez.
O movimento de embarcações turísticas deve ganhar impulso. Hoje, apenas um catamarã para 200 pessoas percorre o trecho, em dois horários, um no almoço e outro para contemplar o pôr do sol, com direito ao jantar. Há um consenso que outras embarcações devem entrar em operação nos próximos anos.
Com toda a área praticamente concedida à iniciativa privada, a esperança do setor do turismo é que não vão faltar recursos para um incremento constante do novo pólo, uma estratégia para segurar o turista por mais tempo na região.
A empresa que explora a roda-gigante, por exemplo, tem uma área anexa onde já se especula a construção de uma arena multiuso, o que deve trazer grandes shows e eventos ao local. “Temos as obras públicas garantidas e isso faz diferença porque o acesso à ponte garante deslocamento rápido e seguro do turista até a região”, ressalta o líder empresarial.
Ele se refere à Perimetral Leste, um corredor de 15 quilômetros entre a nova ponte e a BR-277, e cerca de 9 km da BR-469, conhecida como Rodovia das Cataratas, ligação única entre o centro de Foz e o trevo para a Ponte da Fraternidade, o aeroporto e o Parque Nacional, em processo de duplicação também com recursos da Itaipu Binacional. As duas obras estão em fase inicial e devem ser entregues entre o segundo semestre do ano que vem e o primeiro de 2024.
PARQUE LINEAR
O secretário de Turismo de Foz do Iguaçu, Lourenço Kurten, revela que a prefeitura faz gestões junto ao governo federal para proteger a vista que já encanta quem está do lado de lá do Iguaçu, com a face brasileira da foz cortada por trilhas para pedestres e ciclistas, convivendo em harmonia com a estrutura aduaneira e preservando a atual perspectiva visual.
A ideia é oferecer aos moradores locais um parque linear de cerca de 20 mil metros quadrados no entorno da ponte, da roda-gigante e do Marco das Três Fronteiras. “Com isso, garantiríamos uma proteção ambiental e paisagística”, explica.
Um contraponto de épocas, uma evolução ao cenário da Ponte da Amizade, a primeira ponte da fronteira, cerca de 10 quilômetros ao norte, construída entre 1959 e 1965 sobre o Rio Paraná; e à Ponte da Fraternidade, cinco quilômetros a leste, erguida entre 1982 e 1985, sobre o Rio Iguaçu; ambas sem qualquer estrutura de lazer e turismo nas suas cabeceiras.
Nova ligação fortalece ideia de venda conjunta do destino no setor turístico
O secretário de Turismo de Foz do Iguaçu, Lourenço Kurten, faz uma brincadeira sobre o privilégio dos argentinos que vão até o marco listrado de azul e branco para contemplar a paisagem cada vez mais bonita do outro lado.
Vista da Tríplice Fronteira a partir do Paraguai: à esquerda Puerto Iguazú; à direita, Foz | Foto: Sebastian Jakimczuk/Istock
“No caso das Cataratas, para você ter a melhor vista, tem que estar no lado brasileiro e para experiência mais próxima dos saltos e mais íntimo da mata, você também deve ir ao lado argentino. No Marco das Três Fronteiras, é o inverso. A visão panorâmica está do lado argentino, especialmente à noite, enquanto no lado brasileiro se vive as atrações de perto”, compara. “Até 2015, os brasileiros que iam ao marco invejavam o lado argentino, que já tinha uma boa estrutura por causa da proximidade com o ambiente urbano. Mas agora isso se inverteu, o que está levando muitos turistas do lado de lá a querer estar do lado de cá”, conta.
A diferença dos dois casos torna a conclusão quase instantânea: a Tríplice Fronteira é um destino que deve ser promovido de forma conjunta. “Esta integração é fundamental para aumentar o tempo de permanência do turista, que acaba tendo diferentes experiências em todos nos três países”, comemora. ”Esperamos que o governo paraguaio também se inspire a criar atrativos no terceiro vértice deste triângulo”, conclui.
Com 95% das obras concluídas, data da inauguração ainda permanece um mistério
A Itaipu investiu alto para desafogar o transporte de cargas da Ponte da Amizade. Projetada a princípio apenas para retirar a passagem dos caminhões da velha transposição de 57 anos, a Ponte da Integração vai consumir R$ 463 milhões após sua finalização, prometida para este ano, mas ainda sem uma data determinada, segundo informações passadas à FOLHA pelo DER (Departamento de Estradas de Rodagem do Paraná), administrador da obra.
Negociações entre Brasília e autoridades regionais se encaminham para a liberação da passagem por carros de passeio na nova ponte, sem que isso afete a decisão de excluir a circulação de veículos pesados na antiga.
Do lado paraguaio, a necessidade de se criar um novo complexo viário, o Corredor Metropolitano do Leste, fez o valor total da obra passar de R$ 1 bilhão, montante financiado pelo CAF, o Banco de Desenvolvimento para a América Latina.
No lado brasileiro, a Perimetral Leste contará com seis viadutos, um pátio de caminhões e duas aduanas. As duas grandes obras viárias de acesso estão previstas para 2023, embora cálculos menos otimistas estimem que o pacote completo esteja em operação somente em 2024.
De acordo com a Agência Estadual de Notícias, os 4,5% restantes para a entrega da nova ligação com o Paraguai se referem à colocação de guarda-corpo, a instalação de postes de iluminação, a pintura da sinalização e a instalação dos dispositivos de drenagem. A pavimentação da ponte, com camada de sete centímetros de concreto betuminoso sobre as lajes, já foi concluída.
O descritivo oficial da obra informa que a construção é do tipo estaiada e conta com duas torres de sustentação, com 120 metros de altura. A ponte terá 760 metros de comprimento e um vão livre de 470 metros, sendo o maior da América Latina. Serão duas pistas simples com 3,6 metros de largura, acostamento de três metros e calçada de 1,7 metro nas laterais.
Do lado paraguaio, duas preciosidades na mata ficarão acessíveis
Além da construção de um acesso de 25 quilômetros, o Corredor Metropolitano Leste, que vai contornar a segunda maior aglomeração urbana do país – incluindo uma outra ponte sobre o Rio Monday, pouco se noticia na imprensa paraguaia sobre a exploração turística da cabeceira da ponte em Porto Franco, município de 120 mil habitantes.
O certo é que duas atrações da Tríplice Fronteira devem ter acesso facilitado para quem fará o trajeto nos dois sentidos.
O mais promissor destino é o Salto Monday, chamada de Cataratas Paraguaias, onde o rio de mesmo nome despenca de uma altura de 40 metros no meio de uma mata fechada cortada por trilhas.
O outro é o Monumento Científico Moisés Bertoni, uma atração muito conhecida na região e que hoje é normalmente acessado por passeios náuticos, já que o acesso por carro, com passagem por comunidades indígenas, é precário. As obras do corredor metropolitano contemplam o asfaltamento da via vicinal até a barranca do Rio Paraná, onde está instalado um museu.
O local é um memorial com cinco mil títulos incluindo livros, jornais, revistas, mapas e artefatos científicos do pensador suíço (1857-1929), que usou uma base na mata subtropical para importantes investigações na área da botânica, meteorologia, agronomia e cartografia, granjeando grande prestígio internacional no século XIX.
Receba nossas notícias direto no seu celular! Envie também suas fotos para a seção ‘A cidade fala’. Adicione o WhatsApp da FOLHA por meio do número (43) 99869-0068 ou pelo link wa.me/message/6WMTNSJARGMLL1