Protestos falam mais alto que futebol nos primeiros dias da Copa

São Paulo – Polêmica com o VAR, falhas de goleiros e desfalques por lesão já apareceram nesta Copa do Mundo, mas, até agora, a faceta política é o destaque do evento.

Várias seleções planejaram protestos contra o Catar pelas constantes violações dos direitos humanos.

Na mais recente queda de braço, a Fifa interferiu na ação de sete países europeus, que entrariam em campo com a braçadeira do arco-íris, em apoio às causas LGBTQIA+, com a inscrição One Love.

A entidade que organiza a competição disse que os capitães que entrassem com a braçadeira levariam cartão amarelo.

Em nota conjunta, as federações dos sete europeus afirmaram que estavam “preparadas para pagar multas, que normalmente aplicam sobre brechas nas regras de uniformes”.

“Porém, não podemos colocar nossos jogadores em situação na qual poderiam receber cartões ou mesmo forçados a deixar o campo”, disseram Inglaterra, Dinamarca, Holanda, Bélgica, País de Gales, Alemanha e Suíça.

Nos jogos desta segunda-feira (21), com os primeiros europeus em campo, Harry Kane (Inglaterra) e Virgil van Dijk (Holanda) usaram apenas braçadeiras com a inscrição “no discrimination” (“não à discriminação”), fornecidas pela própria Fifa como uma forma de abafar o protesto.

“Estamos muito frustrados com a decisão da Fifa, que acreditamos que é sem precedentes. Escrevemos para a Fifa em setembro informando nosso desejo de vestir a braçadeira One Love para apoiar ativamente a inclusão no futebol, e não tivemos resposta. Nossos jogadores e treinadores estão desapontados. Eles são fortes apoiadores da inclusão e irão mostrar seu apoio de outras formas”, afirmou, ainda, a nota dos europeus.

A Europa participa do Mundial com 13 países. O capitão Lloris, da França, já havia dito que não usaria a braçadeira do arco-íris. Polônia, Sérvia, Croácia, Espanha e Portugal não se posicionaram.

Antes mesmo do início da primeira Copa no Oriente Médio, os europeus já protestavam contra as condições dadas aos trabalhadores locados nas obras dos estádios e de infraestrutura. De acordo com a Anistia Internacional, milhares morreram. Eles não tinham acesso a assistência médica, salários adequados, Justiça trabalhista e eram obrigados a fazer jornadas exaustivas.

Em março de 2021, a Noruega, do artilheiro Haaland, entrou em campo trajando uma camiseta com os dizeres “direitos humanos, dentro e fora de campo”.

“Muitos [jogadores] estão interessados no assunto, se preocupam e querem fazer algo para tentar contribuir”, comentou na época Odegaard, titular do Arsenal.

Clubes noruegueses queriam inclusive que a seleção boicotasse o Mundial –não foi necessário, já que a seleção não se classificou nas eliminatórias continentais.

Se os europeus recuaram no protesto da braçadeira durante o Mundial com receio das sanções da Fifa, não há nada que a entidade máxima do futebol possa fazer contra a Dinamarca.

A seleção comandada por Eriksen vai entrar com um uniforme com o escudo da equipe e da Hummel, fornecedora dinamarquesa de materiais esportivos, praticamente invisíveis.

“Não queremos ser visíveis durante um torneio que já custou a vida de milhares de pessoas. Apoiamos a seleção dinamarquesa até ao fim, mas não apoiamos o Catar como sede. Acreditamos que o esporte deve unir as pessoas, e quando isso não acontece, queremos marcar uma posição”, postou a marca ao lançar o uniforme.

A duas semanas da estreia, os dinamarqueses fizeram mais uma tentativa de protesto. Eles queriam treinar no Catar usando uma camiseta com a inscrição “direitos humanos para todos”. Desta vez, a Fifa barrou.

“Acreditamos que a mensagem ‘direitos humanos para todos’ é universal e não um apelo político, mas algo que todos podem apoiar”, disse Jakob Jensen, presidente da federação dinamarquesa.

Já a camisa 2 da Bélgica foi barrada pela Fifa dois dias antes da estreia no Mundial, nesta quarta (23), diante do Canadá. A segunda camisa da seleção, branca, ganhou a inscrição “love” (“amor”) na parte interna da gola.

“A seleção belga jogará com a camisa principal vermelha nos três primeiros jogos”, disse o porta-voz da seleção, Stefan van Loock. Caso a Bélgica avance, a questão será resolvida, completou o belga.

E os protestos no Mundial não se restringem aos anfitriões. Nesta segunda-feira (21), a seleção do Irã se recusou a cantar o hino na partida de estreia contra a Inglaterra.

A ação foi uma forma de mostrar solidariedade à onda de manifestações que têm acontecido no país nas últimas semanas, desde a morte da jovem Mahsa Amini, curda de 22 anos morta pela polícia moral, em Teerã, por violar uma lei que impõe um código de vestimenta.

O protesto não ficou restrito às quatro linhas. Muitos torcedores, e torcedoras, levaram faixas e bandeiras com dizeres como “liberdade para o Irã” e “mulheres”. Em outra, as palavras eram “mulher, vida e liberdade”.

Se jogadores e torcida se manifestaram contra o regime iraniano, o técnico da seleção, o português Carlos Queiroz, foi na contramão.

Na entrevista no dia que antecedeu o duelo com os ingleses, foi questionado sobre os direitos das mulheres no Irã. O treinador se levantou incomodado, e antes de deixar a coletiva, respondeu ao jornalista que ele “devia pensar também sobre o que acontece com os imigrantes na Inglaterra, como são tratados”.

Do lado brasileiro, qualquer protesto ou posicionamento a favor dos direitos humanos seria uma surpresa.

Antes do início do Mundial, a Fifa escreveu às federações pedindo que se concentrassem no futebol durante a Copa, e que não deixem que o esporte seja arrastado para questões ideológicas ou políticas. A seleção, que estreia nesta quinta-feira (24) contra a Sérvia, parece ter acatado o aviso.

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