Diretora da SpaceX defende indústria espacial privada e voos turísticos

Diretora de engenharia de satélites da SpaceX, Sara Spangelo estava entre as palestrantes da conferência de tecnologia Brazil at Silicon Valley, realizada entre os dias 16 e 17, em Mountain View, nos Estados Unidos. Nascida no Canadá, Spangelo queria ser astronauta quando criança. Fez primeiro astronomia e, depois, mudou para engenharia. Começou carreira como estagiária no Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa, na Califórnia. Candidatou-se a astronauta, mas não conseguiu avançar no programa.

Depois de uma passagem pelo GoogleX, onde trabalhou com drones, abriu com um sócio a Swarm, que fabricava satélites do tamanho de uma fatia de torrada. Por serem tão compactos, eles podem pegar carona em foguetes comerciais por uma fração do que é gasto para levar aparatos como esse para a órbita do planeta. Em meados do ano passado, Elon Musk, dono da SpaceX, comprou a empresa e sua constelação de 120 satélites, bem como uma rede de estações terrestres.

Em entrevista a VEJA, Sara fala sobre sua carreira, sobre a presença feminina na indústria aeroespacial e sobre seus satélites de monitoramento climático e ambiental. Também defende a indústria espacial privada, os voos turísticos e a entrada de novos países na exploração do cosmo.

A indústria aeroespacial tem homens por toda parte, e você está em uma posição de destaque na SpaceX. Como lida com isso?

Há muitos engenheiros na indústria aerospacial. Meus pais são engenheiros civis, meu pai e minha mãe. Por isso, nunca achei estranho que mulheres fossem engenheiras. Isso me motivou, mas me concentro mais no trabalho. Na verdade, existem algumas mulheres seniores na SpaceX. Gwen Shotwell é a COO, e ela é fenomenal, está lá há 20 anos. E depois há outras mulheres em cargos de liderança sênior. Poderia haver mais no lado da engenharia, mas há muitas nas outras áreas da empresa.

Como se interessou pela indústria aeroespacial?

Meu pai gostava muito de aeronaves. Quase tirou brevê de piloto. Estava sempre olhando para as estrelas, para a lua. Isso despertou a minha curiosidade. Estudei astronomia e achava muito legal, mas não via muitas oportunidades. Foi por isso que mudei para a engenharia. Fiz engenharia mecânica, porque não tínhamos um programa aeroespacial no Canadá, na Universidade de Manitoba. Gostei de dinâmica e mecânica dos fluidos e termodinâmica e, pensei, bem, tudo isso é relevante no setor aeroespacial. Então, se eu gosto desse campo, e gosto da ideia de exploração, faz sentido investir nessa área.

Como foi sua trajetória até a SpaceX?

Depois de me formar em engenharia mecânica, fui para Michigan para fazer um mestrado em engenharia aeroespacial e acabei fazendo também o doutorado. Meu emprego dos sonhos era trabalhar na Nasa, na Califórnia, o que é um grande salto para alguém que cresceu no Canadá. Primeiro consegui estagiar lá, depois consegui um emprego. Acabei trabalhando em missões espaciais. Mas o ritmo das coisas é muito lento. A missão na qual trabalhei, em 2014, só será lançada em 2024. Depois, tive a oportunidade de ir ao Google X, para trabalhar com drones. Depois disso, comecei a Swarms, com a ideia de fazer pequenos satélites. Conseguimos levantar 35 milhões de dólares, muito mais do que imaginávamos. Com isso, tivemos a oportunidade de ingressar na SpaceX e achamos que era um bom caminho para nós. E agora tenho o título que tenho hoje.

Além dos Estados Unidos e Rússia, vários outros países estão entrando na corrida espacial. O que acha desse movimento?

Acho ótimo e positivo se mais países puderem expandir suas capacidades de inovação para lançar satélites e pessoas para o espaço. Claro que existe uma preocupação em torno dessa tecnologia, porque se alguém consegue fazer um foguete, provavelmente poderá fazer outras coisas ruins. É necessário estar atentos a isso. Mas se vamos fazer coisas realmente significativas no espaço, como ir à Lua, a Marte e além, precisaremos de mais países e empresas com capacidade para isso.

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No que diz respeito às mulheres, há muitas astronautas hoje em dia. Você já quis ser uma, certo?

Sim, muitas delas sendo lançadas em foguetes da SpaceX. Tentei ser um astronauta canadense, e cheguei ao top 32. Só que escolheram outra mulher, Jenni (Sidey), que ainda preciso conhecer. Ela não foi para o espaço, está em treinamento. Agora que a SpaceX está fazendo lançamentos com mais frequência e indo para a Estação Espacial Internacional (ISS), espero que mais astronautas experimentem.

Outra tendência são os voos comerciais e turísticos, com empresas como a SpaceX ocupando um espaço fundamental. O que acha disso?

Acho que os humanos têm um desejo natural de explorar outros lugares. Turismo espacial ou experimentar um voo suborbital, ou mesmo um voo orbital na ISS, é apenas uma extensão desse traço da natureza humana. Acho que se puder financiar os esforços para o avanço da tecnologia, é bom. Muitos bilionários estão sendo criticados por fazer os “voos da alegria”. Desde que eles também estejam contribuindo para a tecnologia e a exploração espacial, não vejo problema.

Quando você vai fazer o seu voo?

Provavelmente, vou para pelo menos um voo suborbital, algum dia. Mas, antes, quero ver pelo menos cem pessoas subirem para o espaço com sucesso.

Você também desenvolveu em sua empresa anterior, a Swarm, pequenos satélites. O que eles fazem?

É um trabalho do qual tenho muito orgulho. (Ela mostra segura um pequeno aparelho nas mãos.) Eles têm um sensor acústico que pode detectar o som de uma motosserra do espaço e podem enviar um sinal para as estações terrestres, que enviam agentes para parar esses madeireiros ilegais. No Brasil, estamos trabalhando com uma empresa que detecta a extração ilegal de madeira. Estamos ajudando a proteger a floresta tropical brasileira. É muito importante.

Esses satélites têm outras aplicações?

Na Califórnia, há muitos incêndios florestais, que podem ser detectados por esses aparelhos. Também fazemos rastreamos vacinas que atravessam o oceano para garantir que permaneçam na temperatura correta.

O que diria para as meninas de hoje que querem seguir o seu caminho?

Você pode fazer o que quiser, desde que se dedique. Quando fui para o acampamento espacial, na oitava série, demorei a dizer que queria ser uma astronauta. Meus colegas nunca riram de mim. Era normal para eles. Acho que precisamos mais disso. É preciso trabalhar duro, tem que trabalhar mais do que a maioria das pessoas ou todos ao seu redor para chegar ao próximo nível. Mas se estiver disposta a isso, pode fazer qualquer coisa.

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