Dedução de IR em contribuição extra de fundos de pensão vira disputa judicial

SÃO PAULO, SP, E RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Obrigados a pagar contribuições extraordinárias para cobrir rombos de anos anteriores, participantes dos fundos de pensão de estatais vivem uma disputa judicial contra a Receita Federal para tentar alterar as regras de cobrança do Imposto de Renda sobre esses valores.

Trabalhadores da ativa, aposentados e pensionistas de empresas como Caixa Econômica Federal, Petrobras e Correios tentam estender, para as contribuições extraordinárias, benefícios que os pagamentos ordinários já possuem, como isenção do Imposto de Renda e a possibilidade de dedução dos valores na declaração de ajuste.

Eles alegam que o tratamento diferenciado desrespeita a legislação vigente e onera ainda mais os participantes, que já são obrigados a entregar parcela significativa dos salários a planos de equacionamento de déficits anteriores.

Entre os participantes do Postalis, dos Correios, a dedução de até 12% dos rendimentos vem sendo aplicada aos benefícios e salários de cerca de 80 mil trabalhadores e aposentados desde meados de 2020.

Segundo a Adcap (Associação dos Profissionais dos Correios), autora de duas ações sobre o tema, apesar das liminares (decisões provisórias) favoráveis, alguns participantes ainda caem na malha fina do IR, o que levou a associação a buscar novamente a Justiça.

Em 25 de janeiro, a juíza federal substituta da 20ª Vara Federal do Distrito Federal determinou o cumprimento da decisão que suspendeu os descontos e definiu que a Receita Federal, representada pela União no processo, só poderá exigir a apresentação de documentos extras -a defesa em caso de malha fina- se entender que um contribuinte específico não está abarcado pela dedução.

“O que não se admite”, escreveu, “é a criação de embaraços à efetivação da decisão judicial que foi suficientemente clara ao determinar a suspensão da exigibilidade do Imposto de Renda incidente sobre as contribuições vertidas aos planos de previdência complementar instituídas pela Postalis, ainda que se trate de contribuições adicionais extraordinárias.”

Roberval Borges Corrêa, diretor jurídico da Adcap diz que para os aposentados, que já não têm mais contribuições à Previdência comum, a dedução é aplicada sobre a renda bruta. Para os profissionais da ativa, o abatimento é sobre o somatório dos rendimentos.

Os participantes do Postalis pagam, em contribuições para cobertura de déficit, entre 18,81% e 27,30% de seus salários, aposentadorias ou pensões.

Na avaliação da associação dos Correios, a diferenciação na regra de dedução não faz sentido pois as contribuições têm a mesma finalidade, que é a constituição de patrimônio do fundo.

Na Petros, que gere a aposentadoria dos empregados da Petrobras, por exemplo, a cobrança extra para o equacionamento de déficit de 2015 e 2018 varia de 10,56% a 13,59% a depender do tipo de plano e da situação de cada participante ao fim de 2019. Na Funcef, o valor chega a 20%.

A cobrança do imposto sobre as contribuições extraordinárias foi definida pela Receita Federal em 2017, após consulta da Funcef, a fundação que gere a previdência dos empregados da Caixa. Naquele ano, participantes de fundos da entidade já pagavam contribuições adicionais.

“Não se pode dar às contribuições previdenciárias tratamento tributário diverso apenas em função de sua denominação classificatória”, defendem a Funcef e a Anapar (Associação Nacional dos Participantes de Previdência Complementar e Autogestão em Saúde).

Na ação, eles lembram que o tema já foi alvo de disputa judicial no fim dos anos 1980, com vitória dos beneficiários dos fundos, o que levou à devolução do imposto retido na fonte sobre contribuições extraordinárias cobradas entre janeiro de 1988 e dezembro de 1989.

A Receita diz que a consulta de 2017 é a mais recente sobre o tema. Outras chegaram ao Fisco, mas todas eram vinculadas àquela e chegaram à mesma conclusão, de que a dedução prevista em lei vale somente para as contribuições normais, destinadas ao custeio dos benefícios.

O Fisco afirma também que todas as declarações passam por revisão. Ter ou não uma liminar que conceda a dedução não evita automaticamente que a declaração de ajuste seja retida.

“À medida que as informações são verificadas, a declaração é liberada. Caso haja alguma divergência, a RFB disponibiliza a informação ao contribuinte, oportunidade em que ele, se for o caso, poderá corrigir as informações que julgar equivocadas”, diz.

Segundo Levantamento da Fenae (Federação Nacional das Associações de Pessoa da Caixa), 45 ações coletivas nos estados tentam conseguir a isenção ou a não incidência do IR sobre as contribuições extras.

Diferentemente dos processos dos participantes do Postalis, nessas, os pedidos são para que não haja a limitação de 12% dos rendimentos. Eles também cobram as devoluções de valores pagos.

As entidades de previdência fechada das estatais dizem ser difícil quantificar o valor das ações agora, já que depende do valor de cada contribuição paga por participantes dos fundos de pensão.

O presidente da Funcef, Gilson Nascimento, diz que o abatimento ou a cobrança do IR não tem impacto financeiro para a fundação, mas cria uma demanda grande de trabalho. “Todo mês a gente recebe comandos de decisões judiciais que mandam deduzir. Cada grupo que se forma e consegue o direito, nos gera um operacional de fazer as guias em separado e pagar judicialmente o imposto.”

A fundação de previdência fechada da Caixa pediu à Receita a revisão da consulta de 2017. Também pesou na decisão da Funcef o fato de a TNU (Turma Nacional de Uniformização dos Juizados) já ter fechado entendimento de que as contribuições extraordinárias devem ter o mesmo tratamento tributário das ordinárias.

Com a proximidade do período anual de declaração de IR, as divergências quanto à dedução dos pagamentos extras voltam a dar trabalho para as entidades, pois os informes incluirão também as liminares que concederam o abatimento.

Entre os participantes da Petros, também há ações individuais e de sindicatos com decisões favoráveis ao abatimento, desde que respeitado o limite de 12% dos rendimentos. O fundo dos funcionários da Petrobras diz que cumpre tanto a legislação quanto as decisões judiciais.

Três dos maiores fundos do país, Petros, Funcef e Postalis (dos empregados dos Correios) tiveram que implantar programas de equacionamento de déficits em meados dos anos 2010 para cobrir rombos gerados pela queda no valor dos ativos brasileiros e por investimentos ruins feitos durante gestões petistas.

Com mau desempenho nos últimos dois anos, o setor pede ao governo prazo maior para cobrir os déficits sem ter que apelar a novas contribuições extraordinárias. Eles alegam que os investimentos foram afetados pela pandemia e avaliam que o cenário melhor em 2022 compensará as perdas.

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