A Mesa Diretora da Câmara Municipal de Curitiba admitiu nesta semana quatro representações, por suposta quebra de decoro parlamentar, contra o vereador Renato Freitas (PT), suspeito de participar da invasão à Igreja do Rosário, no Centro Histórico da capital paranaense, no último sábado (5), durante uma manifestação contra o racismo. O processo será analisado pela Comissão de Ética e Decoro da Câmara, que terá o prazo de 90 dias para se manifestar. Desde sábado, Freitas e outra vereadora que participou do ato, Carol Dartora (PT), vêm recebendo ameaças e ofensas racistas.
CURITIBA,PR,05.02.2022:CASO-MOÃSE-PROTESTO-CURITIBA – Manifestantes adentram na Igreja do Rosário durante ato pedindo justiça no caso Moïse, assassinado no Rio de Janeiro. O ato ocorre em frente a Igreja do Rosário, no Largo da Ordem, em Curitiba (PR) neste sábado, 05. (Foto: Emerson Nogueira/Futura Press/Folhapress) | Foto: Emerson Nogueira/Futura Press/Folhapress
O caso ganhou repercussão depois que o presidente Jair Bolsonaro (PL) compartilhou o vídeo do ato e determinou que dois ministérios (Justiça e Direitos Humanos) investigassem o protesto. Freitas nega que a igreja tenha sido invadida, pois a porta lateral estava aberta, e diz que a missa já havia acabado. O vídeo gravado por uma câmera da igreja mostra que o padre Luiz Hass encerrou a missa por causa do protesto e que o local estava vazio quando os manifestantes entraram. Após um pequeno ato, ao lado do padre, eles deixaram a igreja.
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“Analisamos cinco representações (contra Renato Freitas) e entendemos que ficaram demonstrados os requisitos mínimos para admitir quatro delas”, afirmou à FOLHA o presidente da Câmara de Curitiba, vereador Tico Kuzma (Pros). “Assim como apoiamos as manifestações pacíficas, não compactuamos com qualquer violação das liberdades religiosas e da liberdade de culto”. A Comissão de Ética poderá arquivar o processo ou recomendar censura pública, suspensão das atividades parlamentares ou cassação do mandato.
A assessoria de Renato Freitas disse à reportagem que o vereador ainda não foi notificado da decisão e que ele não falaria sobre o assunto.
OFENSAS E AMEAÇAS
Na sessão plenária de segunda-feira (7), a vereadora Carol Dartora mostrou reproduções de ofensas racistas e ameaças recebidas após participar do ato. “Você não dura dois meses”, dizia uma das mensagens. “Não entrei na igreja, mas não condeno a indignação de quem entrou”, disse a vereadora. “Tem muita distorção, a igreja não foi invadida, as pessoas entraram pacificamente e não quebraram nada. Essa repercussão toda mostra que tem algo estranho. É um ano eleitoral e aproveitaram para polarizar”. Primeira vereadora negra de Curitiba, Dartora vem recebendo ameaças desde o início do mandato.
A assessoria de Renato Freitas também confirmou que ele vem recebendo ameaças. Em uma rede social, um participante compartilhou fotos do vereador com ofensas e o texto “Vocês sabem bem como é que se combate essa turma e não é no campo da ideia”.
O presidente da Câmara, Tico Kuzma, determinou que a Procuradoria da Casa fique à disposição dos dois parlamentares. “Hoje no Brasil há um clima de confronto e de radicalização e precisamos fazer um alerta para que as pessoas, ao questionarem os fatos, não cometam crimes como racismo ou ameaça”, afirmou.
Vereador fala em ato pacífico; arcebispo vê atitude agressiva
Ante a repercussão dos atos promovidos no último sábado (5) na Igreja do Rosário, no Largo da Ordem, centro histórico de Curitiba, tanto o vereador Renato Freitas (PT) como o arcebispo metropolitano da capital, dom José Antonio Peruzzo, se manifestaram por meio de notas divulgadas já na segunda-feira (7).
O vereador Renato Freitas (PT) | Foto: CMC/Divulgação
O vereador disse que a entrada no templo ocorreu de forma pacífica, com a igreja já vazia, e o arcebispo considerou que os manifestantes incentivaram comportamentos invasivos e desrespeitosos.
Renato Freitas iniciou a nota relatando que o ato do qual participou no sábado em frente à Igreja do Rosário havia sido organizado pelo Coletivo Núcleo Periférico, contra o racismo, a xenofobia e pela valorização da vida, em memória do congolês Moïse Kabagambe e de Durval Teófilo Filho, homens negros assassinados no Rio de Janeiro nos últimos dias.
“O local do ato foi escolhido por sua relação histórica com a população negra curitibana. A Igreja, inaugurada em 1737, foi construída por e para pessoas escravizadas, uma vez que negros e negras não poderiam entrar em outras igrejas de nossa cidade”, afirmou o vereador na nota.
Ele disse que durante o ato um diácono responsável pela igreja solicitou que os manifestantes fossem para outro local, sob a justificativa de que a manifestação não deveria coincidir com a saída dos religiosos da missa que havia se encerrado.
“Como parte simbólica da manifestação, entramos juntos na Igreja que estava vazia, de forma pacífica, relembrando que nenhum preceito religioso supera o amor e a valorização da vida”, escreveu o petista. “Pacificamente, assim como entramos na igreja, saímos e seguimos com a manifestação, reivindicando políticas públicas para imigrantes e de combate ao racismo na cidade”, prosseguiu.
O vereador encerrou a nota dizendo que “nos surpreende perceber que exaltar o amor e a valorização da vida em uma igreja causa mais indignação que o assassinato brutal de dois seres humanos negros no Brasil.”
NOTA DA ARQUIDIOCESE
Já a nota enviada pela Arquidiocese de Curitiba, assinada pelo arcebispo metropolitano dom Antonio Peruzzo, afirmou que “solicitados a não tumultuar o momento litúrgico, líderes do grupo de manifestantes incentivaram comportamentos invasivos e desrespeitosos”. “Infelizmente, o que houve no último sábado foram agressividades e ofensas. É fácil ver quem as estimulou. A posição da Arquidiocese de Curitiba é de repúdio ante a profanação injuriosa. Também a Lei e a livre cidadania foram agredidas. Por outro lado, não se quer ‘politizar’, ‘partidarizar’ ou exacerbar as reações. Os confrontos não são pacificadores. O que se quer agora é salvaguardar a dignidade da maravilhosa, e também dolorosa, história daquele Templo”, disse o comunicado. (Reportagem Local)
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