Unila produz biogás em colégio público de Foz do Iguaçu

Há pouco mais de um ano, tudo o que sobra do preparo e também nos pratos da merenda dos estudantes do Colégio Estadual Gustavo Dobrandino da Silva, em Foz do Iguaçu (Oeste), deixa de ir para o lixo comum para gerar biogás e, posteriormente, adubo que é utilizado na horta. Da horta, sairão os alimentos que irão ser utilizados na merenda, a ser preparada com a utilização do biogás produzido pelo que sobrou nos pratos.

Um ciclo de vida e transformação promovido por um projeto de extensão da Unila (Universidade Federal da Integração Latino-Americana) e que foi escolhido para compor o Ano Internacional das Ciências Básicas para o Desenvolvimento Sustentável 2022, uma iniciativa da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura).

PASSO A PASSO

Uma equipe de sete alunos do colégio reveza-se para, todos os dias, recolher em baldes as sobras acondicionadas pelas merendeiras. O material é pesado e guardado em uma geladeira para, em seguida, ser triturado e colocado em tambores para gerar o gás metano.

O biogás é armazenado, então, em uma bolsa com capacidade para mil litros, que é transportada ao laboratório, pelo menos uma vez por semana, para aulas das turmas do Ensino Médio e Fundamental. Ali, a equipe do projeto mostra, na prática, alguns conceitos de Química e Física.

Além das aulas, o metano produzido vai ser utilizado para o preparo dos alimentos servidos aos estudantes. O primeiro uso na cozinha aconteceu no início de novembro e a ideia é substituir, futuramente, o gás GLP.

Hoje, cada quilo de alimento que vai para o biodigestor está produzindo 200 litros de biogás. Ao atingir o nível máximo da capacidade do equipamento instalado, a produção será equivalente a dois botijões de 13kg de GLP (gás butano), o nosso “gás de cozinha”. Ainda insuficiente para a substituição total, mas a ampliação do sistema instalado pode garantir à escola toda a energia necessária para a produção de alimentos.

“O biodigestor está produzindo muito gás e com qualidade excelente”, comenta o docente do curso de engenharia de energia da Unila e coordenador do projeto, Ricardo Hartmann. Mas os objetivos vão muito além. “Nossa intenção com o projeto de extensão é colaborar com a formação de uma nova geração de cidadãos através da escola pública”, diz.

|  Foto: Divulgação – Unila 

ENSINAMENTOS PARA A VIDA

No Colégio, a professora de ciências e de química Elis Padilha é a responsável por orientar os alunos quanto aos conteúdos recebidos nas aulas práticas com o uso do biogás. É ela também quem acompanha de perto o grupo de sete alunos que trabalha na linha de frente do projeto, desenvolvendo as atividades rotineiras exigidas para a produção do biogás.

“Estamos iniciando esses alunos no método científico, mostrando na prática como é que se desenvolve um projeto de pesquisa”, comenta, acrescentando que o suporte da universidade foi fundamental. 

Elis vê resultados que ultrapassam os conhecimentos científicos adquiridos. “Têm os ensinamentos que são para vida: o cuidado com o ambiente, a questão de minimizar resíduos, o reaproveitamento dos materiais, o trabalho colaborativo e cooperativo, a organização do trabalho”, cita. 

Por gostar das aulas de ciências e dos experimentos realizados, Aline Caetano dos Santos, ainda estudante do 9º ano, foi convidada pela professora Elis a fazer parte da equipe que iria se responsabilizar pelas ações exigidas para a produção do biogás. Hoje, ela é uma das líderes do grupo. “Eu particularmente, gosto muito de plantas, de fazer experiências. E quando eu vi o projeto, que tem tudo isso, eu gostei muito.” 

 Ao lado de Aline, os colegas Carlos Eduardo Cavalheiro Nunes, Felipe Antunes, Victor e Vinícius Heidercheidt, Jonatas Gabriel Martinez e Gabriele Simpsen, todos do primeiro ano do Ensino Médio, são os responsáveis pela coleta, pesagem e controle dos alimentos que serão transformados e pelos cuidados com a horta.

|  Foto: Divulgação – Unila 

As atividades envolvem não só os estudantes, mas também professores de outras disciplinas, direção, equipe pedagógica e as merendeiras – um trabalho em equipe que resultou em ganhos pedagógicos e sociais. “É fantástico. Enriquece muito”, comemora a diretora do colégio, Alexandra Pilar Milani, contando que também aprende com as pequenas porções de aulas que consegue acompanhar em meio à rotina de gestão. “Aprendo muito e, se é assim, para mim, que não acompanho o processo sequencialmente, imagina para eles, que estão com os neurônios fervendo, a plasticidade cerebral a todo vapor, e estão acompanhando um processo desse, com pessoas de uma universidade pública e federal, com quem eles podem se identificar porque também são de uma escola pública”, destaca.

LEITURA E COR

A transformação produzida pelo projeto já inspirou poemas, contos e relatos nas aulas de português da professora Ângela da Silva. O cantinho onde estão instalados o biodigestor e a horta ficou mais colorido com os desenhos que cobrem o muro. E foi para esse local que a professora levou os estudantes para uma leitura sobre os significados dos diferentes elementos que compõem a tela em que se transformou o muro, e que inspiração poderiam trazer também os equipamentos que têm funções práticas e definidas muito distantes da arte e da literatura. “Vi aqui um momento de eles se sensibilizarem para poder entender e sentir tudo isso. Há muitas leituras”, comenta.

Numas das aulas, os estudantes puderam conversar com o autor do grafite, Rafael RPG. “Ele deu uma aula de cultura.” Os textos produzidos serão expostos em um varal, no mesmo espaço que lhes serviu de inspiração. As palavras têm o poder de fazer crescer uma sementinha, de nutrir o espírito. É um alimento diferente”, diz Ângela.

 ESCOLA INTEIRA SE ENVOLVE

Numa das pontas desse ciclo de aprendizagem está a merendeira da escola Marli da Silveira, um elo importante no projeto. É ela quem cuida de separar folhas, cascas e as sobras de alimentos, matéria-prima para a produção do biogás. “É um projeto importante para a escola. No lugar de jogar no lixo, isso tudo vai para o projeto. É economia para a escola e para o meio ambiente”, comenta ela. Essa participação de diferentes áreas é vista como significativa para Ricardo Hartmann. “A escola inteira acaba se envolvendo. Os alunos se veem fazendo parte de uma história. A gente vê um aumento do interesse pela ciência”, comenta.

Financiado pela Seti (Superintendência Geral de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior), do governo paranaense, e pela Unila, o projeto “Investigação do potencial de geração de biogás e biofertilizantes utilizando resíduos orgânicos alimentando pequenos biodigestores em colégios estaduais do Paraná”, poderá ser estendido para outras escolas públicas.

Para isso, estão sendo produzido manuais, com instruções detalhadas, gerados a partir da experiência acumulada até agora com a instalação e uso do biodigestor no Colégio Dobrandino. Dois deles estão em fase final de elaboração para publicação: o de montagem de biodigestores de pequeno porte e o de operação. A expectativa é que os manuais estejam disponíveis no início do ano que vem.

A equipe também programou um “Dia internacional da permacultura na Tríplice Fronteira” para dezembro, quando serão convidados outros colégios de Foz do Iguaçu, de Puerto Iguazu e Ciudad del Este. No evento, entre outras atividades, haverá uma oficina da compostagem. A intenção é registrar em vídeo o evento e divulgar no site do Ano Internacional das Ciências Básicas para o Desenvolvimento Sustentável 2022. “O Ano Internacional visa valorizar projetos e atividades que coloquem a ciência no cotidiano dos alunos. Desmistifica aquele conhecimento que é sisudo, é difícil para os alunos absorverem”, finaliza o o coordenador Ricardo Hartmann. (Com informações da Unila)

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