O streaming descolonizou o cinema. Antes os vídeos domesticaram o cinema, levando os filmes das telonas para as televisões das casas (lembra quando a gente ia a videolocadoras e pagava multa por atraso? Já meus netos nem sabem o que é videolocadora!) Mas, se os filmes que víamos saíram da telonas para a tela da tevê, continuavam a ser feitos em Hollywood ou Europa. Agora, porém, você pode ver, por exemplo, um bom documentário feito num pequeno país, ou ótimos filmes indianos com direito a músicas de repente…
Fui menino de bater pé quando começava o filme na telona, o piso trepidava, aí aparecia o leão da Metro, o condor da Condor ou a mulher da Columbia e começava o filme. Hoje não, o filme só vem depois de desfile de logomarcas, algumas tão envolventes que parece ter começado o filme.
Que, no padrão Nefflix, começa sempre com alguma cena de ação intensa, para em seguida aparecer letreiro: dois anos antes…
Com cacoetes assim, a produção em série de filmes e séries parece desmilinguir o cinema. Já me peguei tentando prestar atenção em séries que, depois se vê, nem deviam existir. Fico pensando se a produtora não contratou um bom roteirista para começar a série e um aprendiz para continuar.
São tantos filmes que a gente se perde no catálogo até achar algo que parece valer a pena, e pode ser uma decepção, como podemos ignorar um filme por causa da sinopse, até descobrir que é um bom filme apesar da sinopse. Deveria haver – ou há e nem sei? – um guia strímico, para te apresentar bons filmes conforme tuas preferências.
O lanterninha era símbolo do cinema antigo, com sua farda e sua lanterna a indicar lugares em cinemas lotados, coisa rara hoje. O celular é símbolo do e-cinema que chega de todo o mundo apenas para algumas pessoas numa casa ou uma só pessoa onde estiver. Mas as salas de cinema resistem com poltronas que reclinam a um toque de dedo, salas menores e, talvez também por isso, com som estrondoso de doer nos ouvidos. Lembro as cortinas do Cine Ouro Verde abrindo, enquanto as paredes iam mudando de cor ao som de bela música. Isso de dia, quando a meninada jogava “bafo” disputando figurinhas nos grandes degraus da entrada. À noite, homens botavam gravata para ir ao cinema!
Lembro de esperar em fila de dobrar quarteirão para ver um filme, como lembro da nonna Paulina, já na velhice, indo ao cinema levada pelas filhas, só para ver filmes de Mazzaropi. E agora vejo os netos vendo filmes, um no quarto e outro na sala, com a naturalidade – e o isolamento – de quem nasceu com celular na mão.
Quantas mudanças e, entretanto, no fundo o cinema pouco mudou, continua a existir porque gostamos de histórias da vida e notícias do mundo, e o streaming nos entrega isso baratinho porque o custo se distribui por milhões de pessoas.
Mas, para evitar o isolamento individual, aqui em casa vemos cinema juntos, porém na sala “de tevê”, nosso cantinho doméstico e
internacional graças aos aplicativos. De vez em quando vamos a cinema de shopping… por saudade. Os amantes do cinema são sentimentais.
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